Ciro Gomes
Apr 28th, 2010
by NPTO.
Terminou a campanha de Ciro Gomes à presidência. Não se pode dizer que termina bem. Mas é bom ter em mente o papel que Ciro Gomes teve no debate político brasileiro dos últimos quinze anos, porque, se ele diminuir muito politicamente (já tem gente falando nele para técnico do Flamengo, um cargo que ninguém mais quer), alguém vai ter que fazer esse papel.
Ciro Gomes foi, provavemente, o melhor quadro produzido pelo PSDB. Os medalhões tucanos formaram o PSDB quando já eram cobras criadas no MDB. Aécio é um grande político, muito forte em seu Estado, mas não é um inovador programático, e foi formado na família dele: sem dúvida, existiria sem o PSDB, como herdeiro de dinastia política. O Ciro era diferente: era para ser a nova geração dos caras, trabalhado pelo partido.
Uma coisa que certamente merecia ser melhor explicada é o que, exatamente, fez Ciro dar o salto para fora do PSDB. Mas o fato é que, voltando de Harvard, para onde foi por sugestão do FHC, Ciro era outro político: e um político melhor. De maneira algo edipiana, quando rompeu com o ninho tucano, virou político de primeira divisão.
Durante o governo FHC, o populismo cambial nos estrupiava as contas, mas o PT, desde 94, estava imobilizado pelo conflito interno entre moderados e radicais, e só conseguia jogar na defesa, reagindo contra tudo que parecesse neoliberalismo. O PT observou estupefato o Plano Real, sem conseguir dizer que era bom quando era bom nem dizer que era ruim quando ficou ruim.
Ciro foi o o sujeito que fez o debate com FHC nessa fase. Nem sempre foi completamente claro ou consistente, mas parecia mais consciente de que a situação era insustentável do que o PT. Vejam o que disse o Jânio de Freitas durante a crise de 98 (durante a qual as reservas caíam 1 bi por dia):
A eventualidade de reflexos eleitorais do desastre não poderia faltar, entre as pessoas cientes do que se passa com, ou contra, o Plano Real. No empresariado o assunto é tratado, como se esperaria, a partir de temores de uma reviravolta na corrida (re)eleitoral.
Não há indício, porém, de que a campanha de Luiz Inácio Lula da Silva seja capaz de valer-se das circunstâncias na medida necessária para uma reviravolta. Sua campanha é confusa como estratégia, imprecisa como tática, desarticulada e pobremente óbvia como discurso. Para que esses componentes mostrassem resultados favoráveis à candidatura, superando o desgaste e a alta rejeição de Lula, só mesmo se ao adversário acontecesse o imprevisível.
Pelo que tem mostrado em suas bem articuladas considerações sobre o governo, a crise e as medidas necessárias, Ciro Gomes é o candidato que tenderia a crescer em uma situação como a atual. Mas não dispõe de tempo nem de espaço nos meios de comunicação.
A eleição de 98 foi a menos debatida da nossa democratização: o PSDB sabia que a economia ia estourar, e não queria muito puxar esse assunto, e o PT não teve coragem de dizer que era preciso desvalorizar o Real, e, sem dizer isso, não tinha muito o que dizer.
Dois dias antes da votação, tive uma aula de economia em que o professor disse: “Já que o Lula vai perder, mesmo, devia aproveitar e dizer logo o que todo mundo sabe que vai acontecer”. Ninguém disse, mas o Ciro chegou perto:
O candidato do PPS à Presidência da República, Ciro Gomes, acha que o presidente Fernando Henrique Cardoso não será reeleito. Mas, se for, “o segundo mandato já começará em emergência, com dois cenários possíveis, um ruim e outro péssimo”.
Ciro explica o porquê: “A dívida pública explodiu e 78% do patrimônio privatizável já era. Mas fazer um pacote fiscal espetacular depois das eleições vai ser o fim. Vai matar politicamente o FHC”.
Além da expansão da dívida pública, Ciro destaca o crescente déficit fiscal e o que ele considera “mais explosivo”: o desequilíbrio das contas externas.
Ex-ministro da Fazenda no governo Itamar, como FHC, Ciro descreve o Brasil de hoje como “um país parado, estagnado, proibido de crescer, com um desemprego galopante”.
Classifica de “balela” a promessa da equipe de FHC de que a prioridade de um eventual segundo mandato seria social.
“Nisso o Gustavo Franco (presidente do BC) tem razão: não há recursos para a área social”, disse Ciro, referindo-se a recente entrevista de Franco. Para ele, Franco pode ter sido sincero por um motivo: “Ele está se blindando para preparar a demissão, porque sabe que não tem jeito”.
Foi isso mesmo que aconteceu. O Ciro foi a única força política dando uma arejada na discussão em 98. Com o Mangabeira debaixo do braço, ele tinha uma contra-agenda, o que pelo menos permitia a discussão. Na reforma da previdência, propôs algo como utilizar grana da previdência para financiar investimento (vejam aqui). Depois da crise de 2008, não parece uma idéia tão boa investir a grana da previdência, mas era uma tese a ser discutida, o que era raríssimo na grande estagnação do debate brasileiro que ocorreu quando o Real começou a fazer água.
Em 98, um célebre intelectual tucano disse a uns estudantes de pós, eu incluso, logo depois de Ciro participar do “Roda Viva” (acho que foi o Roda Viva), que ele era “um extraordinário trabalho de joalheria política”. Disse, inclusive, que se Ciro jogasse as cartas bem na campanha, “muitos tucanos cristianizariam o Fernando”. É minha opinião que até hoje Ciro conta com isso; e que até hoje não conseguiu jogar as cartas direito.
Na eleição de 2002, foi também nos bastidores da campanha de Ciro que o debate importante foi travado, e ali eu acho que nasceu o impasse em que Ciro está hoje.
Quando o Jereissati resolveu apoiar o Ciro (uma das alianças mais interessantes da política brasileira, que merecia melhor análise), resolveu que, para sua candidatura ser viável, era preciso ter um programa que não fosse feito pelo Unger, visto como um radical (falso) doidão (verdadeiro) e que não sabia nada de importante (absolutamente falso).
Tenho certeza, aliás, de que a opinião de nossos formadores de, bem, opinião foi, enfim, formada, depois de encarar as sabe Deus quantas páginas de “Politics”.
Pois bem, o Jereissati fez uma jogada de mestre, e conseguiu que o José Alexandre Sheinkman fizesse um programa para o Ciro. O programa era o Agenda Perdida. Ciro não quis o programa. Quatro anos depois (porque eu escrevi quatro anos depois? Eu, hein.Valeu, Matamoros, pelo toque) Uma versão retrabalhada por economistas ortodoxos do Rio chegou às mãos de Palocci entregue por Armínio Fraga durante as célebres reuniões no Hotel Glória.
O que Jereissati ofereceu a Ciro, e Palocci aceitou, foi uma passagem de volta ao mainstream político brasileiro. Em 98, era insano dizer que FHC, que segurava o câmbio enquanto as reservas brasileiras chegavam ao nível de duas fichas de fliperama e um vale refeição, era o candidato da boa gestão econômica (o que tinha sido em 94). Nesse contexto que Delfim fez sua famosa declaração sobre o poste.
O Jereissati disse para o Ciro, vai lá, seja o candidato da direitaultrapassando pela esquerda. Seja o PSDB do PSDB.
Ciro não topou. Pode parecer idiota que não tenha topado, mas a verdade é que Ciro realmente tinha sua própria agenda, que era mais pró-mercado em alguns aspectos (como na questão da previdência) menos em outros (principalmente na questão da dívida, que muita gente achava que ia ter que ser renegociada – e não teve) do que o mainstream tucano.
E tinha uma estratégia que parecia boa: como o PT não se revelou à altura do poste do Delfim em 98, era perfeitamente possível que definhasse. Estava claro que ninguém ia votar em partido sem programa econômico realista, mas também era claro que ninguém mais, como primeira opção, queria os tucanos. Parecia gol aberto para o Ciro.
Eu não tenho nenhuma prova do que vou dizer agora, mas é minha opinião: o sucesso de Ciro em 98 – porque ter lá seus 10% concorrendo pelo minúsculo PPS foi uma façanha – foi um alerta para o PT. Ficou claro que, se o partido não virasse uma alternativa de poder viável, alguém apareceria para ocupar o espaço na esquerda brasileira. Quem não faz, leva. E teve gente séria, como o Touraine, achando que quem poderia levar era o Ciro:
(…) os brasileiros querem um programa de governo. Talvez um dia eles adotem aquele de Ciro Gomes, mas, em termos gerais, eles não acreditam que o descontentamento e a ideologia diversa constituam um programa de governo. Não é a pessoa de Lula que está em questão, mas a ausência de uma verdadeira unidade programática do PT. Não basta denunciar a globalização e condenar a priori todas as políticas que se abrem à economia mundial para convencer a população, ou convencer a si próprios, de que uma mudança de política trará efeitos benéficos; essa perspectiva suscita, ao contrário, incerteza e temor.
O mais importante para o Brasil, assim como para muitos outros países, é livrar-se de escolhas retóricas para definir escolhas reais, sempre muito mais limitadas e cujos termos e consequências podem ser definidos de maneira precisa.
O resto vocês já sabem. O PT aceitou o programa que o Ciro não quis e ganhou. Ciro foi inteligente o suficiente para perceber que era uma vitória sólida, e apoiou Lula, no processo se livrando da âncora Roberto Freire (e do Unger, que, tentando andar sozinho na política, levou uma surra memorável de quem entendia mais da coisa do que ele). Ciro percebeu que não tinha como disputar espaço com um Lula forte. E resolveu esperar o Pós-Lula.
Mas essa estratégia era muito arriscada. Com o PT fazendo parte do mainstream econômico, a janela que Ciro teve diante de si em 98 não tinha cara de que ia se abrir de novo. Se o governo Lula fracassasse, Ciro afundaria com ele (o que percebeu, mais que muita gente, durante a crise do Mensalão). Se o governo fosse um sucesso, como foi, porque o PT não lançaria seu próprio candidato?
Entrando em 2010, várias The Economist depois, havia dois cenários bons para Ciro:
Um era o Pós-Lula radical: Aécio se lança como candidato moderado, que apoiou Lula em vários momentos e teve sempre boas relações com o governo. Ciro adere, talvez como vice, e forma-se uma chapa que, sejamos honestos, seria difícil de perder. Ma sisso não aconteceu.
Serra estrangulou a candidatura Aécio, e está tentando roubar-lhe a estratégia, sem, entretanto, nenhuma das credenciais de Aécio: o serrismo foi oposição radical ao governo Lula em todos os momentos, e não vai ser difícil a campanha de Dilma arrumar citações do Serra contra tudo que o Lula fez – inclusive a política econômica ortodoxa. Serra, assim, fechou o espaço para Ciro pela direita.
Por outro lado, Dilma poderia ter empacado. Não era uma candidata muito orgânica do PT (é incrível que se tenha conseguido colar-lhe a pecha de radical), era completamente deconhecida, se não chegasse ao segundo lugar com chances de vitória no começo desse ano, o bloquinho (PSB/PDT/PCdoB) provavelmente lançaria Ciro, e a cristianização prevista lá atrás aconteceria do outro lado do espectro. Ciro seria o candidato de Lula, mesmo se Lula não quisesse.
Isso poderia perfeitamente ter acontecido, mas não aconteceu. Talvez esperando por Aécio, Ciro se manteve bastante passivo nos debates dos últimos anos (o que, convenhamos, não é da sua natureza), e, enquanto isso, Dilma se fez. Os pequenos partidos gravitaram para os candidatos com mais chance de vitória, e a Ciro restou o PSB, com base no Nordeste, onde o apoio de Lula é fundamental.
Não tenho tanta certeza quanto outros comentaristas a respeito do futuro de Ciro. Ele é como aqueles jogadores de futebol que começaram tão novos que a gente esquece que eles ainda são relativamente jovens. Daqui a quatro anos o quadro pode ser completamente diferente. Mas o fato é que Ciro parece estar entrando em sabático.
Na saída, ainda fez o que fez melhor nos últimos quinze anos, e levantou dois debates: um é a possibilidade de haver uma crise econômica causada pelos desequilíbrios da balança, o outro uma crise de governabilidade devida à voracidade das lideranças do PMDB.
A princípio, concordo com o Meirelles: o câmbio flutuante vai reequilibrar a balança, eventualmente. Mas eu acho que, no meio da intervenção do Ciro, como no meio do editorial de hoje da Folha, está a discussão sobre o risco do câmbio estrupiar a indústria antes de tudo se reequilibrar.
O comentário do Ciro sobre a competência do Serra é, na verdade, eco de um outro, feito um tempo atrás: Serra seria mais capaz de fazer esse debate (porque é sua galera heterodoxa que vive falando nisso – vejam o Sérgio Guerra na Veja), mas não faz porque é politicamente comprometido.
Eu, na minha humilde sociólogo-blogosidade, permaneço agnóstico a respeito da discussão sobre o câmbio, com viés pró-Meirelles. Claro, é preciso dar condições para um aumento de produtividade da indústria brasileira, como o editorial da Folha bem nota, mas isso é preciso de qualquer maneira. Se quiserem fazer isso por preocupação com a balança, beleza.
Vale dizer, se o candidato do PT estivesse falando em doença holandesa, ou qualquer coisa parecida com isso, lá se ia o Risco Brasil.
A segunda crise, a política, é perfeitamente possível, mas há algo a ser considerado. O intelectual tucano supracitado sempre dizia isso do PFL durante o governo FHC: quando você joga esses caras pra frente dos holofotes, muda o jogo. Eles passam a ser co-responsáveis pelo desempenho do governo diante da opinião pública. Para o cara que quer fazer sacanagem e só fazer sacanagem, é melhor ficar no Congresso quietinho, não no governo. Vamos ver como Dilma desata esse nó, se ganhar.
É absolutamente imbecil dizer que o debate democrático perde quando a eleição passa a ter um candidato a menos, mas tem gente dizendo isso. O que é verdade é que, se Ciro resolver ir para o exterior passear com a Patrícia Pillar (quem poderia culpá-lo?), outro sujeito vai ter que ser o levantador de bola do debate brasileiro.
PS: agora pesquisa volta a ser importante, pelo seguinte: vejamos quantos dos votos de Ciro vão para Marina. Um apoio formal de Ciro a Marina teria várias vantagens, mas sacrificaria sua base de apoio no Nordeste. Marina, vale dizer, já parece bem mais simpática à ortodoxia econômica. Acho que assim que Ciro bolar uma recompensa para pedir, entra na campanha da Dilma.
PSTU: em um certo sentido, Ciro está como o Nick Clegg, dos Lib Dems, estaria, se o Gordon Brown tivesse 80% de aprovação e a economia britânica estivesse indo bem.
PSTUdoB: uma hora a gente vai ser capaz de interpretar a trajetória do Ciro como exemplo de como a emergência do PT embaralhou as velhas estratégias da política brasileira. Acho que o Ciro notou isso, mas nem sempre teve muita margem de ação. Quando teve, em 98, eu acho que perdeu a chance.
De volta para o Ceará
Política
Autor(es): Maria Cristina Fernandes
Valor Econômico – 30/04/2010
Ciro Gomes já ficou outros anos sem mandato, mas sempre pôs a boca no trombone para não perder audiência nacional. Desta vez, apesar de ter idade para começar tudo de novo, há vários sinais de que o ostracismo pode empurrá-lo para de volta para o Ceará. As circunstâncias distintas das que marcaram outros períodos de entressafra podem ser resumidas em dois nomes: Dilma Rousseff e Eduardo Campos.
Por mais que recomponha boas relações com a candidata que já disse não estar preparada para conduzir o país em meio a uma crise, Ciro não terá como acumular o mesmo cacife político que em 2003 lhe deu um ministério no governo Luiz Inácio Lula da Silva.
Circulou com desenvoltura e lealdade no governo forrado pelos 10 milhões de votos com os quais apoiou o candidato petista no segundo turno de sua primeira eleição.
Desta vez, além de lhe faltarem votos, pode também lhe fazer falta um partido. Em 2006, quando deixou o governo para disputar um mandato de deputado federal tinha em mente consolidar no PSB uma liderança que se construiu fora dele.
Ofereceu sua votação, que acabou sendo a de deputado proporcional mais votado do país, para ajudar a salvar o partido da cláusula de barreira. Estreou combativo, mas acabou como um parlamentar apagado e ausente. Não havia como não ser cúmplice da estudada indignação de Ciro com seu isolamento na Câmara enquanto sobravam cargos na estrutura da Casa para os reis da negociata parlamentar.
Por trás do voluntarismo, começavam a ficar aparentes os prejuízos à sua carreira do poder sem alternância no seu berço político. Na definição de um conterrâneo seu, a ausência de oposição no Ceará, que já dura uma geração, deseducou Ciro para a política.
O PT, que, nesse período, elegeu duas prefeitas de capital, não se viabilizou como polo alternativo. O cabo de guerra armado pela prefeita Luizianne Lins em torno do estaleiro que o governador Cid Gomes tenta levar para Fortaleza é apenas o sinal mais visível de uma liderança à qual sobra carisma e falta jogo de cintura.
A aliança entre Ciro e Tasso Jereissati é mais longeva que a dos tucanos em São Paulo. Sua preponderância sobre uma economia 18 vezes menor e menos dinâmica explica porque a longevidade no poder asfixia mais os cearenses que os paulistas.
É a rota inversa do governador de Pernambuco, Eduardo Campos, presidente do PSB de crescentes antagonismos com Ciro. Depois de amargar o 5º lugar na disputa pela Prefeitura do Recife (1992), Campos se tornaria o braço direito do avô no governo do Estado (1995-98). Com a derrota acachapante de Miguel Arraes na tentativa de reeleição, Campos iniciaria lenta trajetória de reconstrução de seu campo que passaria pela adesão ao governo Luiz Inácio Lula da Silva, do qual acabaria ministro.
Entrou na disputa pelo governo do Estado em 2006 como a terceira força. De um lado, estava o candidato do governador duas vezes bem avaliado, Jarbas Vasconcelos (PMDB). Em torno de Mendonça Filho (DEM), que já governava Pernambuco desde a desincompatibilização de Jarbas, reunia-se a tríplice aliança PMDB/DEM/PSDB, uma das poucas sobreviventes ao fim do governo Fernando Henrique Cardoso.
Essa aliança aglutinava os principais interesses empresariais do Estado. Ao contrário do que aconteceu no Ceará, onde a ascensão da dupla Tasso-Ciro se fez com o engajamento de uma nova elite empresarial no pacto contra os coronéis, em Pernambuco, a ascensão de Campos margeou esses interesses. Só ao longo de seu mandato, com os caminhões de dinheiro que o governo federal tem despejado no Estado, é que a nova dinâmica da economia local alinhavou-se com o Palácio do Campo das Princesas.
Segunda força do Estado, o PT tinha na candidatura de Humberto Costa o beneficiário natural da popularidade do presidente da República no seu Estado natal. No terceiro mandato na Prefeitura do Recife, o PT sempre foi uma barreira importante à construção de uma hegemonia em torno do governador.
A equação local em torno da aliança PSB-PT, assim como em outros Estados, foi determinante ao malogro da candidatura Ciro. Lula hoje tem 95% de ótimo e bom em Pernambuco, mas o governador temia os ruídos da transferência dessa unanimidade numa disputa entre dois palanques locais. No primeiro turno de 2006, Campos e Humberto, somados, ficaram a 666 mil votos (59%) dos votos do que o presidente teve por lá na reeleição (71%).
O malogro da candidatura própria do PSB trouxe à tona o que, cedo ou tarde, acabaria se evidenciando: o partido talvez fique pequeno para Ciro e Eduardo. Em ambas as vezes em que se pronunciou por escrito sobre a decisão do partido, Ciro usou termos duros para se referir aos comandantes do PSB. Na primeira, disse que não estariam à altura do que a história lhes impõe. Por derradeiro, escreveu que democracia não se faz com donos da verdade.
No comando de um Estado que cresceu 3,8% no ano passado, ante o recuo de 0,2% no PIB nacional, Eduardo Campos é um dos poucos governadores que ainda não sabem quem será o adversário à sua reeleição. Sob sua presidência, o PSB tornou-se majoritário no Nordeste, governando um eleitorado (Pernambuco, Ceará e Rio Grande do Norte) superior ao do PT (Bahia, Piauí e Sergipe).
Se reeleito, deixará o governo do Estado como o equivalente, para o campo de forças hoje reunido em torno de Lula, ao que Aécio é hoje para a oposição: nomes da geração pós-1964, que, ao contrário de Serra e Dilma, cresceram na micropolítica herdada do PSD de seus avós e que, mesmo sendo economistas, parecem mais à vontade num encontro de prefeitos do que numa mesa redonda sobre o nó cambial.
Para se viabilizar nacionalmente, Campos depende que seu campo político se desloque do PT. Nome de visibilidade nacional muito mais evidente, Aécio ainda precisa esperar que o eixo de seu partido se desloque de São Paulo. Não acontecerão se um Lula 3 for posto em marcha, mas anunciam a perspectiva de temperança num cenário em que, noves fora Ciro, Serra ou Dilma vão elevar a temperatura da política.