Dúvidas sobre a estratégia política do Governo Dilma

“O video ficou descontextualizado, melhor um bumerangue pra demonstrar meu temor.”

Tenho tentado escrever sobre a estratégia política do Governo Dilma desde os seus 100 dias. Confesso que não está fácil. Tenho mais dúvidas que respostas. Diferentemente de outros momentos, simplesmente não sei o que dizer. Antes tudo era mais fácil. Qualquer bobagem servia, se encaixava. Afinal, políticos são eram previsíveis.

Hoje tudo está nublado, não enxergo uma linha definida. A verdade é que é muito difícil pra qualquer pessoa dizer “eu não sei”. Isso é assumir publicamente a falta de conhecimento. No mínimo aceitar uma incapacidade dedutiva inadmissível numa época em que nós afogamos sob um dilúvio incessante de informações.

Mas talvez eu esteja apenas constrangido, envergonhado. Vergonha alheia, melhor dizendo. Pois, por ai, só se lê  certezas absolutas, verdades inabaláveis. Tudo ou é um desastre completo, ou é de uma virtú impecável. Oito ou oitenta, o maniqueísmo eleitoral – às vezes necessário, aceitável – atingiu a completude, e tomou conta de toda a política.

Nos clippings-blogs e artigos da velha mídia é certeza que o Governo Dilma acabará. Que o desastre é inevitável. Que ela é arrogante, grosseira, tosca, e  tratando assim os (sensíveis) políticos irá inevitavelmente destruir a “governabilidade”. E que já “circula em Brasília”, que ela pode não concluir o mandato.

Nos blogs governistas/progressistas o que se lê é que é o estado-da-arte da política. Uma estratégia perfeita. Bem executada, uma limpeza, uma faxina ética. Decisões inequívocas na área econômica. Uma revolução na política. E que essa assepsia renderá incontáveis votos junto à classe média. Novos tempos. Uma recuperação dos valores éticos pela esquerda através de uma estratégia magistral para se defender do julgamento do Mensalão que virá pelas mãos vingadoras do Joaquim Barbosa.

Pode ser. No momento realmente não há nada ameaçando a governabilidade. Ou alguém aqui imagina o PR no purgatório, longe das benesses do poder por longos 3 anos e meio? Ou o PP? Ou o PMDB? Até aonde vi, os sinais mais claros é de novas adesões, seja com o PV (pós-Marina), seja com o PSD (do Kassab e cia).

Mas política é bumerangue. Quantas vezes já vimos políticos no Congresso colocando a fatura na mesa do presidente? Seja com Lula, seja com FHC. Sei que ela é diferente. Sei que foi surpresa pra muitos, inclusive pra mim. Não tem a ver com a corrupção em si. Tem a ver com o aprendizado que uma campanha eleitoral traz. Tem a ver com deixar de ser técnica e se tornar uma grande política. De certa forma me irrita essa adesão à ideia de satanização da política.

Eu estou com Lula nessa (ah vá…), se a presidenta não permitir que a Gleisi seja a Dilma da Dilma, não haverá politização das ações. E 2012 pode mostrar isso. Gestão não politiza, por mais que os tecnocratas insistam nesse ponto. Um governante não pode terceirizar a política sob o risco de uma alienação perigosa. Ela deveria transpor os conceitos que está usando na economia. Nenhum presidente é uma ilha. Ignorar o Congresso eleito, voltar a fazer o jogo da mídia de escandalizar seletivamente o “nada”, confiar numa oposição acuada e decadente, são decisões perigosas.

Enfim, não sei se vai dar certo. Torço que dê. Mas sou cético por natureza. A principal lição que aprendi nos últimos anos é que os políticos são traiçoeiros, a velha mídia  brasileira tende ao golpismo por natureza e a classe média, continua extremamente volúvel.

“Só sei que nada sei”, mas tenho certeza que não gosto dessa combinação.

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2 comentários sobre “Dúvidas sobre a estratégia política do Governo Dilma

  1. É verdade que o estadão já enfiou um sabre nas costas da presidenta e o restante da mídia grande não é flor que se cheire. Mas o que exatamente poderíamos esperar da Dilma em casos em que a Polícia Federal e o Ministério Público pegaram políticos com a mão na botija? Ela deveria ter apoiado os ditos cujos e partir para cima da mídia? Acho que não, ela não teria absolutamente nada a ganhar com isso. Seria um movimento com atrito demais e benefícios inexistentes. Devemos lembrar que – ao contrário de Lula – a nossa presidenta não conta com toda a trajetória histórica de lutas e identificações com a massa operária. Ao aceitar a renúncia dos implicados em investigações, ela se isenta e manda uma mensagem clara aos partidos que a apoiam e aos ministros que a ela se subordinam, isso até ajuda a “moralizar” a administração.
    Não adianta a Dilma querer brigar contra a hipocrisia moralisteira da mídia, nessa briga nós que a apoiamos não teríamos muita diferença a fazer. A Dilma está completamente correta na sua estratégia. Ela vai ter que abusar mesmo do pragmatismo. Ela até poderá tentar construir um imaginário popular de defensora dos pobres e alentadora da classe média em ascensão. Mas ela vai levar muito tempo “comendo feijão”, se fortalecendo para alcançar isso.
    Vai ser assim, “bem na manha” mesmo, que ela vai ter a única chance de construir um projeto que leve a sua marca, grande o suficiente para que forme musculatura política (no sentido mais personalista) para fazer como o Lula e encarar a mídia – ainda que com alguma discrição e jogo de cintura, tal como Lula fez – e colocar a oposição entreguista em seu lugar.
    Fora isso, apesar de concordar que a saída do Ministro da Agricultura foi um tento da manipulação midiática, aos poucos a Presidenta irá melhorar o seu relacionamento com o Legislativo, isso vai acontecer na medida em que ela conseguir colocar a nave em velocidade cruzeiro. Na verdade ela ja iniciou esse processo, disseram por aí que ela deu uma “guinada”, mas me parece que não, ela ja tinha isso em vista.
    Quando chegar o momento certo, ela com certeza irá com tudo no “corpo a corpo”, mas vai levar junto algumas realizações e, se tudo der certo, gente que a apoie por ver algo (muito) a ganhar em um processo de desenvolvimento em que o setor produtivo/industrial dê as cartas, mas sem deixar a massa de fora da divisão dos lucros.

    1. Realmente. Acho que nas situações que se colocaram não havia escapatória. Não estou afirmando que não concordo (quem pode ser contra uma rigidez no combate a corrupção). Só estou ressaltando a preocupação com a forma com que a gestão política tem ocorrido.

      Não adianta ela se enclausurar no Planalto e agir como Ministra Chefe da Casa Civil. Ela não é isso mais, ela é Presidenta (com muito orgulho) da Republica Federativa do Brasil. Um cargo iminentemente político. Tanto que só agora voltou a fazer política.

      Se esse é o estilo dela, ela tem que politicamente atuar pra que seja assim de fato.

      Mas concordo com quase tudo o que vc disse.

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