Dualidade

Qdo a gente começa a envolver com a (ciência) política umas primeiras lições é que não se deve julgar, no momento, os políticos por suas ações do passado recente.

Principalmente pq se percebe que com o passar do tempo a verdade vem a tona e a motivação de certas ações políticas nem sempre são “visíveis” no momento em que ocorrem.

Pq fiz essa “longa” introdução? Pra poder postar um ótimo artigo do Zé Dirceu (não gosto dele, por n motivos, o principal era que sabendo como é a luta política, não teve a abnegação necessária, em nome do projeto, mas isso fica pra outro post) sobre a Fidelidade Partidária e a forma como foi implementada no Brasil.

O artigo é esclarecedor e mostra a dualidade das decisões do TSE (mais essa jabuticaba). Na medida em que a justiça superior começa a agir politicamente, vejo problemas institucionais na nossa democracia.

Problemas que seriam rapidamente resolvidos se o Legislativo não se omitisse tanto.

Zé Dirceu – Um Espaço para a Discussão do Brasil – ARTIGOS DO ZÉ

Fidelidade partidária?
Por Zé Dirceu
(artigo publicado no Blog do Noblat em 04 de setembro de 2009)

Quando presidente do PT, várias vezes fui fazer consultas ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para exigir fidelidade partidária de deputados que deixavam o PT. Sempre ouvi uma resposta direta e conclusiva: na Constituição não há referência à perda de mandato por infidelidade partidária, em seu artigo 55, que enumera as causas da perda do mandato.

O TSE instituiu a fidelidade partidária ao decidir, em março de 2007, que o mandato pertence ao partido e, portanto, um político poderia perdê-lo caso mudasse de legenda. Em outubro daquele ano, o STF (Supremo Tribunal Federal) ratificou a decisão e ordenou que o TSE definisse as regras para a cassação. O tribunal, então, editou resolução em que o político não perderia seu mandato em casos de fusão de legendas, saída para a fundação de uma nova sigla, mudança do programa partidário ou discriminação sofrida pelo partido.

Aparentemente, havia sido feito um bem para o país, ainda que por meios tortos, pois estava, na prática, legislando ―da mesma forma que já vinha fazendo durante as eleições em vários aspectos. O comportamento levou o Congresso Nacional a aprovar uma nova legislação eleitoral para impedir que os ministros do TSE continuassem a usurpar seu poder exclusivo de legislar, segundo nossa Constituição.

Quando o TSE instituiu a fidelidade partidária, condenou a mudança de partido de políticos da oposição para os partidos da base do governo e tomou posição claramente crítica ao governo do presidente Lula. A ponto de o ministro Arnaldo Versiani ter afirmado ―ao votar contra o pedido não aceito do PT para manter o mandato do deputado Paulo Rubens, que se filiara ao PDT mesmo tendo sido eleito há pouco tempo pelo PT― que “a postura ideológica e a política desempenhada pelo PT terminaram por sofrer modificações a partir de 2003, com a ascensão ao governo federal”.


A manifestação da Corte mostrou-se completamente contraditória às razões do mesmo tribunal quando instituiu a fidelidade partidária, numa evidente demonstração de julgamento político. Não caberia ao TSE decidir se um partido mudou ou não de programa ou ideologia, ou mesmo de “política”, pois é da natureza dos partidos, principalmente de um partido que toma decisões democraticamente como o PT, mudar sem abrir mão de sua ideologia ou programa. Ou seja, a alteração não implica necessariamente em mudança da natureza do partido.

Não há nada que justifique a mudança de partido, a não ser o desejo de ir para a oposição. Isso é nítido em casos como o do deputado Paulo Rubens, que traiu o voto do eleitor que o elegera.

Fiquei estupefato com tal reviravolta sem maiores explicações nas decisões recentes do TSE, autorizando deputados e senadores a mudar de partido. Em 17 casos analisados, só um perdeu o mandato. Sem pudores, a Corte aplicou “a fidelidade para inglês ver”, mas no passado recente impediu a mudança de parlamentares do PSDB e DEM para partidos da base do governo ―prática quase que diária no governo FHC, sob o pretexto de infidelidade com apoio de toda a mídia, que os chamava de “infiéis” e clamava por suas cassações via TSE.

Agora salta à vista a decisão política do TSE, confirmada pela leniência e pela cumplicidade com a infidelidade partidária, o que comprova o casuísmo nos julgamentos do tribunal e a necessidade urgente de uma mudança legal via Congresso Nacional.

Aliás, diga-se, errou o Congresso ao não instituir a fidelidade partidária via emenda constitucional. Errou também, de boa ou ma fé, o TSE ao instituir uma fidelidade “faz de conta” e, pior, ao ser transformar em um tribunal político que julga o caráter dos programas partidários. O tribunal tem atuado como uma espécie de comissão de controle existente em partidos comunistas e que julgava a filiação ou o mandato de seus membros.

A solução é simples: eleito por um partido, o cidadão só poderá deixá-lo no final do mandato e fica sem mandato e só pode se candidatar na próxima eleição. É uma quarentena de dois anos, já que temos eleições a cada dois anos. Dessa forma, o julgamento fica nas mãos do eleitor, e o político terá de pagar um preço por deixar seu partido. É o mínimo, se quisermos realmente instituir a fidelidade partidária e não apenas fazer oposição a esse ou aquele governo, ou agir como tribunal político.

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